Mundo corporativo: relatos reais de assédio moral a grávidas

Motivado pelo relato de uma paciente que vivia uma situação complicada na  empresa que trabalhava após ficar grávida decidi fazer essa reflexão e relato.
R.B.S (é fictício, por motivos éticos) é uma jovem paciente gestante, 26 anos, cheia de vida e tranquila. Começou o pré-natal com uma colega obstetra que optou por não fazer mais o parto normal e foi então encaminhada para o meu consultório para darmos sequência ao pré-natal. Estava bem em suas visitas regulares, até que na última delas notei que RBS estava um pouco triste, mais quieta e ao tocar no assunto fez o desabafo. Inicialmente contou como era sua vida na empresa em que trabalhava. Uma atmosfera boa, seu contentamento e satisfação de fazer parte do referido local de trabalho (vamos omitir por motivos óbvios). Era uma boa funcionária, bem conceituada e estava sempre bem colocada entre os mais produtivos. 

Mas o clima mudou a partir do momento que a barriga começou a crescer.  Sua gerente imediata começou a mudar a forma de tratá-la e logo ficou evidente que era hostilizada. Começaram as perseguições caracterizadas pela dificuldade de negociação de folgas, imposições de tarefas mais árduas, sobrecarga no horário do almoço do colega de caixa, escala para cobertura de atividade durante as férias do colega e por fim remanejamento para o arquivo morto do banco, setor onde as condições de trabalho são piores até mesmo para uma não grávida. Assédio moral caracterizada pela colocação em reunião dos funcionários de que não seria tolerável outra gestante no banco com exceção da própria chefe que por sinal ainda é mãe.

Situações semelhantes são vividas por muitas grávidas que atuam no mercado de trabalho competitivo e caracterizado por metas e objetivos a serem perseguidos a qualquer custo. Durante meus 15 anos de vivência profissional em consultório de ginecologia e obstetrícia me  deparo com situações semelhantes. 

Outro atual caso é o da paciente gestante M.D.F,  28 anos, que trabalha em uma empresa de mercado atacadista e que, grávida de  6 meses e com dores, tentou negociar na empresa e foi informada não haver solução para o caso dela, sendo obrigada a resistir enquanto der conta.
Há alguns anos outro caso que presenciei  foi da gestante M.A.S, funcionária de uma empresa do ramo de telefonia, até o início da gestação era considerada a melhor vendedora da empresa e sempre era muito bem tratada pelos gerentes enquanto estava conseguindo vender. Após o início da gestação e suas intercorrências viu sua situação mudar completamente. Passou a ser hostilizada, humilhada e teve que aguentar ser remanejada para o depósito da empresa onde as condições de trabalho eram piores.
Mulheres que de uma hora para outra se veem em situação adversa de forma abrupta devido à gestação. Antes vistas como produtivas e parceiras da empresa, vivem no momento seguinte a conversão para bode expiatório, mau exemplo, perseguição e humilhação. 

Nos últimos anos a mulher vem crescentemente ocupando mais espaço e posições dentro das corporações, mas a que custo? Elas estão retardando a idade da maternidade para galgar mais capacitação técnica, melhor posição no mercado de trabalho e melhores salários.

Este é o preço que as mulheres devem pagar pela maternidade?
Será que as empresas não podem se tornar mais humanas e parceiras dessas mulheres?
Será que todas as empresas estão com a mesma prática?
Não. Felizmente não é assim.

Buscando relatos de experiências prévias encontramos ideias e atitudes diferentes em empresas que já enxergaram que a mulher é parceira em qualquer momento.  Segundo o presidente do Great Place to Work‚ no Brasil, José Tolovi Jr., os gestores das melhores empresas passaram a associar a maternidade com o desenvolvimento de competências valorizadas pelas organizações como empatia, paciência, humanidade, habilidade em trabalhar em equipe, capacidade de delegar e negociar. 

“As melhores empresas reconhecem que a maternidade traz maturidade à mulher e reforça a capacidade de lidar com diferentes perfis de pessoas, entre outras qualidades valorizadas pelos gestores. As empresas mais produtivas e lucrativas são as que cuidam dos colaboradores — e as mães sabem gerir com maestria esse cuidado”, afirma. 

As empresas devem preocupar com a retenção de seus talentos. Pois o estado gravídico é temporário e logo aquela mulher estará de volta ao seu lugar dentro das corporações e melhorada com as qualidades e competências que só a maternidade proporciona à mulher.
Temos bons exemplos de empresas  que buscam  parceria com as gestantes e apoiam a mulher no seu momento mais feminino e  mágico da vida.  Exemplos de programas especiais para as gestantes como o programa futura mamãe da Todeschini. Benefícios como a isenção do pagamento de co-participação nas consultas pré-natais e nos exames referentes à gestação. Possibilidade de se ausentar do trabalho por oito horas mensais para ir a consultas e fazer exames. Cobertura para vacinas infantis obrigatórias e isenção de co-participação no pagamento das consultas pediátricas no primeiro ano do bebê. Após a licença maternidade regular a funcionária pode tirar uma nova licença, de um período ou integral, até que a criança tenha um ano de idade. 

Na Unimed Vales do Taquari e Rio Pardo — indicada a Melhor Empresa para a Mulher Trabalhar, em 2006 — o período de amamentação, que por lei é de seis meses, foi prolongado para nove meses. Há o reembolso-creche, benefício oferecido até os oito anos de idade da criança. Horário diferenciado também é um atrativo. As mães-funcionárias escolhem a hora que vão trabalhar dentro do período das 7 horas às 18 horas. A meta é permitir que as funcionárias  se dediquem à família e conciliem os horários profissionais com as atividades dos filhos.

Queremos com este texto sensibilizar o ambiente corporativo a enxergar a gestante não como um estorvo, um entrave. A construção desse ambiente menos hostil vai proporcionar mais saúde para suas funcionárias e mais Ibope para essas empresas, pois com certeza elas vão se  tornar melhores lugares para se trabalhar. Em vez das empresas correrem atrás das melhores funcionárias, elas é que vão desejar ocupar esses postos de trabalho.


João Félix Dias

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